Em mês de Agosto, típico das férias, o Bicho assume: esteve hibernado num longo tempo, esperando as melhores condições para germinar novamente e mais forte. Estes tempos não foram de esquecimento pela sua casa; foram raros os períodos em que as saudades não bateram na porta, espreitando o acordar deste longo sono - e em olhos entreabertos, o Bicho foi desenhando novos sonhos, novos projectos e, hoje, volta em força para os fazer ACONTECER! Saudades?
As tartarugas de estimação são animais populares nos lares portugueses: são calmas, não estragam materiais e são extremamente belas (principalmente em bebés). No entanto, um ponto essencial a ter em conta é que estes animais também duram muitos... anos!, e como tal é essencial ter cuidados especiais pelo bem-estar longínquo destes patudos.
São animais muito pacíficos e que apenas se demonstram agressivos quando perto de machos, pelo que não é aconselhada a colocação de duas tartaruga-macho no mesmo espaço.
De notar que, segundo o mais recente Decreto-Lei sobre a temática, estes animais não podem ser retirados da natureza sem quaisquer cuidados. Assim, legalmente está escrito que:
Art. 4.º 1: Com vista à protecção das espécies da fauna inscritas no anexo II da Convenção, e salvo licença, a emitir nos termos do artigo 8.º, são proibidas:
a) A sua captura, detenção e abate intencionais;
b) A deterioração ou destruição intencional dos respectivos habitats;
c) A sua venda, detenção para venda, oferta e transporte para venda e exposição com fins comerciais;
d) A sua perturbação intencional, designadamente durante o período de reprodução, de dependência e de hibernação;
e) A destruição ou a apanha intencionais de ovos do meio natural, mesmo vazios.
2: O disposto no número anterior não se aplica quando:
a) Os animais tenham nascido e sido criados em cativeiro;
b) Os animais tenham sido capturados no seu meio natural antes da inscrição da respectiva espécie nos anexos da Convenção;
c) Os animais tenham entrado no nosso território de acordo com as normas relativas à protecção da respectiva espécie.
Art. 5.º 1: São proibidas, salvo licença, a emitir nos termos do artigo 8.º, as actividades de captura, detenção e abate intencionais das espécies de fauna inscritas no anexo III da Convenção.
2: As actividades de venda, detenção, transporte e oferta para venda de animais vivos ou mortos das espécies a que se refere o número anterior serão reguladas por portaria conjunta dos Ministros do Planeamento e da Administração do Território e da Agricultura, Pescas e Alimentação.
Para qualquer animal em cativeiro, o ideal é que o local em que o mesmo se instala seja o mais similar ao ambiente natural do animal. Assim, para as tartarugas há necessidade de grandes áreas, preferencialmente em cercados ao ar livre com temperaturas adequadas.
Acontece que, devido às variações de temperatura externas, por mais cuidados ajustados ao animal, é necessário fazer a mobilização deste para o interior da casa: a esse processo é dado o nome de invernação, sendo que aqui incluímos processos como hibernação e migração.
Ou seja, a invernação refere-se à mudança do animal de um meio com condições adversas para um meio com melhores condições, seja por meio indirecto (auxílio do dono) ou por meio directo. Dentro dos meios directos temos a migração do animal, mas podemos incluir igualmente a hibernação.
A hibernação refere-se a um estado letárgico do animal, induzido ou natural do mesmo, em que as funções são amplamente reduzidas ao absolutamente necessário para a sobrevivência. Este processo ocorre geralmente quando o animal não se mobiliza, mantendo-se no local de condições desfavoráveis.
As tartarugas são animais ainda não totalmente domesticados, pelo que se apegam aos seus instintos mais básicos de espécie.
Em natureza, muitas são as espécies que durante os meses mais frios hibernam: a temperatura diminui e o animal não consegue regular os seus níveis internos, os insectos morrem e as plantas murcham, pelo que 'adormecem' nestas épocas para acordar em períodos mais avantajados.
A hibernação ocorre geralmente e mais facilmente nos meses de Setembro ou Outubro, mas muitas são as variáveis relacionadas, como temperatura e características intrínsecas, durando de semanas a 3 ou 4 meses.
Tartarugas em cativeiro não precisam necessariamente de hibernar para a sua sobrevivência, no entanto períodos de hibernação anual podem aumentar o sucesso reprodutivo. 1
Antes de pensar numa hibernação, é importante considerar outra solução menos desafiadora para o animal: se a tartaruga esta habituada a viver ao ar livre e as temperaturas externas ficam inferiores a 20 graus ou caso a mesma se encontre doente / com perda de peso drástica, podemos antes considerar mover o pequeno patudo para o interior das nossas casas. Este é um processo menos drástico para o animal, resultando na igual tentativa do animal encontrar novas condições que facilitem a sua sobrevivência.
No entanto, vários são os autores que defendem igualmente que permitir a hibernação é positivo, uma vez que normaliza os ciclos reprodutivos do animal - algumas espécies não se conseguem reproduzir sem passar por este período! 1
Existem muitas tartarugas cuja espécie não hiberna naturalmente no seu habitat recorrente, pelo que exigir que estes animais hibernem não é a melhor solução. Uma frase aplicada a estes casos é (mas não regra):
"Quanto mais distante do equador a espécie ocorre naturalmente, maior a probabilidade de hibernar; quanto mais próximo do equador, menor probabilidade." 2
Só após confirmação de que a espécie geralmente hiberna em condições adversas é que devemos considerar a hibernação, induzindo a mesma ou permitindo naturalmente a sua ocorrência.
Se considerarmos colocar o animal dentro de casa, o recinto para este invernar deve ser fechado, pelo menos nas bordas, para impedir que o animal se magoe e ter em consideração o tamanho do mesmo.
No mercado existem inúmeros modelos para armazenamento do animal, baratos, compactos e fáceis de limpar; deve ser escolhido um substracto natural para a cama e, em seguida, seguir as instruções para a espécie da tartaruga em questão. Dentro dessas instruções é crucial atenção redobrada nas temperaturas adequadas de aquecimento, temperatura diurna, luz UVB de ciclo bidiário (atenção que estas devem ser substituídas a cada 6-12 meses) e presença de água e alimentos apropriados.
Algumas dicas para a construção de um bom recinto são:
~ O espaço deve ser amplo e fácil de limpar;
~ A lâmpada de aquecimento deve ser colocada cerca de 2 pés acima da cabeça do animal;
~ O uso de luz UV fluorescente é aconselhado para controlo do comportamento alimentar - durante 12 horas deve ser mantida ligada e, nas 12 horas seguintes, desligada para simular a noite;
~ Pode ser adicionado ao recinto uma bandeja de água ou com areia/cascalho molhado para manter a atmosfera húmida;
~ Banhe diariamente a sua tartaruga com água até ao pescoço, durante 5 a 10 minutos, sempre com supervisão (estes animais adoram banhos, encorajando o seu hábito positivo de beber líquidos);
~ Forneça esconderijos na área, facilmente formados com caixas de papel e resíduos ou roupas velhas;
~ Uma vez no interior da casa, é importante suplementar a tartaruga com vitamina D, duas vezes por semana.
É muito importante relembrar que a hibernação não é adequada a animais doentes ou com elevadas perdas de peso, uma vez que as reservas nestes casos são mínimas e o risco do animal não voltar a acordar é muito elevado. Caso a tartaruga tenha estado doente no ano presente, nesse mesmo ano não deve hibernar.
Uma vez decidida a hibernação, o animal deve ser alimentado com dietas ricas em energia e vitaminas A e D3 cerca de 4-6 semanas antes da hibernação. Alguns autores suportam que se deve parar de alimentar o animal durante 14 dias antes da hibernação, no entanto o animal parece perceber por si quando é o timming certo para essa paragem, interrompendo a sua alimentação autonomamente. A hidratação não deve ser negligenciada, providenciando constante água fresca para banhos regulares e embebendo os animais a cada 3-4 semanas (durante 5 minutos).
A temperatura também não deve ser o mais confortável possível: se o animal foi removido para o interior de casa, é aconselhado manter este numa divisão da casa não aquecida. As horas de luz do dia devem ser progressivamente diminuídas para simularem o Inverno.
É essencial uma avaliação pré-hibernação por um médico veterinário para confirmar que a altura é a mais adequada ao processo. Também, após início de hibernação, é importante pesagens regulares do animal: é normal uma perda de peso de 1 a 2% do peso anterior, mas não superior as estas percentagens.
Alguns animais, principalmente jovens, quando em épocas invernis, tendem a diminuir a ingestão de alimento drasticamente e reduzir a sua actividade. Esta é uma forma de resposta do animal, menos intensa do que a hibernação, com comportamento resiliente mas móvel às alterações.
Para retirar a tartaruga do processo de hibernação, basta colocar a mesma nas condições ambientais adequadas: aquecemos o animal lentamente, retornando o organismo ao seu funcionamento normal e acordando o patudo. Podemos aquecer inicialmente o animal até aos 15ºC, mantendo esta temperatura durante 2 dias e aumentar para os 18-20ºC por mais 2-3 dias; por fim, coloque o animal na temperatura ambiente e alimente o seu patudo.
Este processo dura alguns dias e podem ser necessárias semanas até que o animal volte a alimentar-se normalmente (porém, caso demore mais de uma semana até retornar a se alimentar, visite um médico veterinário). Hidrate o animal continuamente durante os primeiros períodos pós-hibernação.
1. Pesquise se a espécie da sua tartaruga hiberna; só siga para os passos seguintes caso a resposta seja positiva;
2. Consulte um médico veterinário para determinar se o período é o mais correcto para a hibernação e se o animal está em boa condição de saúde;
3. Pese o animal - deve continuar a pesar a cada 2-3 semanas durante a hibernação; 2
4. Providencie uma dieta rica em energia, vitamina A e D3 durante o Verão; alguns alimentos ricos em vitamina A podem ser cenoura, abóbora, couve, brócolos, entre outros;
5. No final do Verão, aumente a ingestão de fibra do animal, como alfafa e feno;
6. O animal deve hibernar apenas após um período de jejum, de modo a impedir o risco de "adormecer" com alimento no trato gastrointestinal que entre em putrefacção e cause a sua morte; desta forma, impeça o animal de hibernar caso verifique que o mesmo não atravessou um período de jejum;
7. Hidrate o animal no período pré-hibernação e durante a hibernação, mergulhando a tartaruga em águas pouco profundas durante alguns minutos;
8. Diminua a temperatura gradualmente, mas não abaixo dos 10ºC: pode iniciar reduzindo a temperatura até aos 15ºC e manter este valor por 2-3 semanas, para permitir uma última digestão do animal; reduzir depois gradualmente até aos 10ºC para permitir a hibernação e, uma vez em hibernação, manter o animal nos 4,5ºC (com constante monitorização dos termómetros, várias vezes ao dia); 3
9. Caso o animal hiberne no exterior, tenha certeza de que o mesmo não se vai afogar ou congelar no local de hibernação; tenha especial atenção também se tem animais no exterior que, apesar da diminuição da temperatura, não hibernam - traga-o para o interior de casa;
10. A cada 1-2 semanas inspeccione o animal, verificando se existem sinais de lesões ou infecção, depósito de fezes e urina ou sinais de predadores.
1. Hibernating Water and Box Turtles | Gulf Coast Turtle and Tortoise Society. Retrieved from http://www.gctts.org/node/80
2. Hibernation Guidelines for Turtles and Tortoises. Retrieved from http://www.anapsid.org/hibernation.html
3. McArthur, S., Wilkinson, R., & Meyer, J. (2008). Medicine and Surgery of Tortoises and Turtles (p. 516). John Wiley & Sons.
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